22 agosto 2014

A Arte da Comunicação Eficaz

© Alessandro Loiola



A arte da comunicação eficaz merecia por si só uma biblioteca inteira. De quase nada adianta seu conhecimento enciclopédico se ele não pode ser compreendido pelas pessoas ao seu redor. A comunicação correta aumenta consideravelmente as chances de suas propostas se transformarem em mudanças ao invés de resistências. Sua capacidade de dialogar claramente é tão ou mais importante quanto onde você cursou a faculdade ou quantas pós-graduações traz no currículo.

A maioria dos cursos de medicina peca de modo imperdoável ao não ensinar quesitos específicos de liderança e comunicação aos seus alunos. Formam-se médicos cheios de verdades científicas, mas poucos comunicadores. E, na hora de conversar com o paciente, sua intransigência em fazer valer a ciência sobre todas as coisas de nada ajuda. Para melhorar substancialmente sua interação com a equipe, os pacientes e a comunidade, atente para 7 equívocos comuns da comunicação:

1• VOCÊ ACHA QUE SABE FALAR. Uma porção substancial dos desentendimentos reside no fato de você achar que está passando uma determinada mensagem quando, em contrapartida, o outro está fazendo uma interpretação completamente invertida da conversa.

Aprender a comunicar-se de modo efetivo é como aprender a utilizar um programa de computador: os comandos devem ser bem claros, cada tecla deve ser apertada com um objetivo bem determinado. Nada de meias palavras, segundas intenções ou agendas secretas: apenas apresente sua mensagem de modo simples, limpo e não agressivo.


2• VOCÊ ACHA QUE É CAPAZ DE MUDAR INTIMAMENTE OUTRA PESSOA. Aceite isso desde o princípio. Você pode criar um contexto que favoreça a mudança do outro, mas sua força de vontade ou seu ímpeto jamais mudarão a natureza de outrem. A pessoa pode curvar-se à sua vontade para conseguir um ganho secundário, terminar uma discussão, sair de uma situação constrangedora, mas apenas o fato dela ter concordado com seus argumentos quer dizer muito pouco.

Você não pode mudar outra pessoa: a mudança é um processo de forças internas, nunca externas. Por isso, “não diga aos outros como fazer as coisas: diga o que tem que ser feito e deixe que lhe surpreendam com os resultados” (George S. Patton).


3• VOCÊ NÃO RELAXA. Se quiser realmente resolver uma situação, relaxe. Qualquer diálogo produz melhores resultados em um ambiente mais sereno. “Um capitão assustado assusta a tripulação inteira” (Lister Sinclair).


4• VOCÊ DISCUTE CULPADOS AO INVÉS DE DISCUTIR SOLUÇÕES. Fazer consultas cheias de observações criticando o(s) outro(s) é uma excelente maneira de desperdiçar seu tempo. Primeiro, porque não existe essa história de “crítica construtiva”. Toda crítica dói e destrói. Mesmo que pouco. Ademais, as críticas que você lança no calor da discussão irão apenas lhe distanciar da pessoa criticada.

Reclamar indiscriminadamente, gritando e xingando aos quatro ventos, pode ser uma tentação enorme, mas acredite: ao final da tempestade, você terá perdido terreno que já havia sido conquistado. Talvez você faça isso para assumir o papel de vítima indefesa ou agressor invencível e balançar a autoconfiança do outro, mas o que você está fazendo de fato é diminuindo o nível de confiança do outro em relação a você.


5• VOCÊ NÃO ADICIONA PESSOAS À SUA PROPOSTA. Durante qualquer discussão para definir metas (de tratamento, de atendimento, de cobertura vacinal ou pré-natal, etc), a palavra “você” frequentemente é utilizada para solidificar o isolamento e o papel de vítima de quem se está reclamando: “você tem que seguir a receita”, “você tem que mudar”, “você podia muito bem ter feito isso ou aquilo”, etc.

Um profissional verdadeiramente adulto e comprometido tem a coragem de representar o seu papel, ao invés de eximir-se dele. Esse profissional utiliza a palavra “nós”. “Nós temos que encontrar um caminho para melhorar o tratamento”, “Nós vamos nos entender”, “Nós poderíamos ter agido de outra forma”. “Nós” não é uma palavra que fecha portas. Muito pelo contrário: um único “Nós” pode abrir várias delas.


6• VOCÊ SEMPRE COMEÇA PELOS PONTOS FRACOS. Existe um pré-requisito estratégico se você pretende obter sucesso com suas propostas: além de saber comunicar-se, conhecer as limitações da argumentação, estar relaxado(a), adicionado e focado nas soluções, você deve iniciar sua investida utilizando as ferramentas fortes de que dispõe.

Conheça os pontos fortes de sua equipe, de seu local de atendimento, de seus pacientes e da comunidade a que você está assistindo: é muito mais fácil e eficaz construir sobre pontos fortes que desperdiçar seus esforços escrutinando os pontos fracos. Muitos colegas perdem um tempo enorme tentando resolver absolutamente tudo que está errado, e nunca conseguem resultado algum.

Um exemplo que ilustra bem a construção de propostas sobre pontos fortes versus pontos fracos pode está ilustrado na seguinte história: há muitos anos, as companhias aéreas pediam ao final do vôo que os passageiros não esquecessem seus pertences de mão, mas esqueciam de um detalhe simples: estamos habituados a prestar atenção ao verbo da frase, não na sua negativa. Então, enquanto as portas eram colocadas em manual, tudo que ficava martelando na cabeça dos passageiros era para que “esquecessem seus pertences de mão”. O não da frase passava batido, e incontáveis bolsas, casacos, guarda-chuvas, óculos, livros, mamadeiras, frasqueiras, fones de ouvido, travesseiros de viagem, agendas e telefones celulares iam fazer sua escala no setor de achados e perdidos do aeroporto.

Uma pequena mudança na recomendação fez uma enorme diferença, reduzindo drasticamente a quantidade de objetos deixados para trás. Hoje, após o pouso, a mensagem diz ...”e lembrem-se de pegar seus pertences de mão”.

Pode parecer bobagem, mas funciona. Eu lhe digo: “Não pense na cor vermelha!” e você automaticamente pensa em azul, transparente, música, borboleta ou... na cor vermelha?

O mesmo enredo vale para reuniões com grupos maiores. Ao invés de iniciar o encontro com a atmosfera de que “Não adianta porque nada nunca muda”, tente inspirar-se com o lema “Gosto do nosso trabalho porque existe sempre uma abertura para conversar e melhorar as coisas”. Ainda que isso seja uma mentira temporária - sim, adultos mentem, lamento lhe informar -, o fato é que este tom de diálogo provoca um tipo de profecia auto-realizável, evocando no outro o desejo de corresponder àquela observação.

Esqueça as fraquezas, esqueça o que você não gosta e o que não está dando certo – porque colocar isso como ponto de partida provavelmente é o que você tem feito e não tem funcionado. Comece o diálogo salientando os pontos fortes que você conhece tão bem (no outro ou na sua equipe) ou as forças que você gostaria que fossem demonstradas com maior constância. Não tente consertar coisa alguma de imediato. Concentre-se em administrar uma injeção de entusiasmo e deixe esse novo estado de ânimo vicejar por um dia ou dois.

Podemos não ser perfeitos naquilo que fazemos com entusiasmo, mas certamente somos uma porcaria naquilo que fazemos sem entusiasmo algum.


7• VOCÊ ACHA QUE SABE OUVIR. O desejo de aliviar o sofrimento é uma das melhores ferramentas motivacionais entre profissionais de saúde. E não existe melhor maneira de expressar esse desejo que ouvir com todo o seu coração, sem intenção de julgar, condenar ou criticar. Permita que seu interlocutor perceba que está bem no coração dos acontecimentos naquele momento e que as decisões que ele/ela toma fazem toda a diferença para o sucesso do que está sendo proposto.

Ajude o outro a manifestar o que ele/ela deseja, preste atenção até você descobrir, em silêncio, qual é o problema. E então, transforme o problema em uma meta que esteja no interesse de ambos. Mostre o caminho com serenidade e justiça, e veja o que acontece. Quando este processo de escutar é feito de modo consciente, construímos uma estrada de valorização, estabilidade e progresso.

2 comentários:

Luis Lemos disse...

Excelente texto, Dr. Alessandro!
Sábias palavras, pra profissão e pra vida!
Estou gostando muito dos artigos, até mesmo dos mais científicos, voltados mais pra área médica.
Gostaria muito que TODOS os médicos pensassem assim, ou melhor ainda, praticassem.
Obrigado!
Luis Lemos

Rogério Bastos disse...

Muito boa a matéria!Principalmente nesse momento em que os olhos andam voltados pra TV onde as manchetes falam do médico que estava sendo procurado pela justiça.Tratar bem, tratar de maneira correta, paciente merece atenção e respeito, é isso aí. Valeu pelo artigo e pela prática. Abrs.