13 janeiro 2015

Metformina e Diabetes

© Alessandro Loiola 
 
 
 
Com tantos remédios novos para tratamento do diabetes melito, a Metformina deve continuar sendo uma das primeiras escolhas? Para responder essa pergunta, um estudo observacional recente procurou determinar o efeito inicial de classes diferentes de hipoglicemiantes orais e a necessidade de terapia subsequente com outros hipoglicemiantes (Berkowitz SA, Krumme AA, Avorn J, et al. Initial Choice of Oral Glucose-Lowering Medication for Diabetes Mellitus: A Patient-Centered Comparative Effectiveness Study. JAMA Intern Med. 2014 Oct 27).
 
Foram incluídos mais de 15 mil pacientes sem antecedente de intervenção prévia para diabetes e que haviam iniciado tratamento com metformina, sulfonilureia (SU), tiazolidinediona (TZD) ou inibidor de dipeptidil peptidase (DPP4). O desfecho primário foi o tempo até intensificação do tratamento, definido como adição de uma classe diferente de hipoglicemiante oral. Os desfechos secundários incluíram intervalo até eventos cardiovasculares (coronariopatia, ICC, angina instável, AVC isquêmico, IAM ou procedimento de revascularização miocárdica), ICC isoladamente, atendimento em um serviço de Urgência & Emergência (U&E) devido hipoglicemia, e qualquer outro atendimento de U&E devido problemas relacionados ao diabetes. 
 
E a campeã foi... Metformina ! 
 
No grupo inicial de pacientes, 58% iniciaram o tratamento com metformina, 24% com uma SU, 6% com um TZD e 13% com um DPP4. Durante cerca de 1 ano de acompanhamento, observou-se uma diferença significativa de intensificação do tratamento entre as classes medicamentosas. Dos pacientes em uso de metformina, 25% necessitaram um segundo hipoglicemiante oral, comparados a 37% do grupo SU, 40% dos TZD e 36% dos DPP4. 
 
Com relação ao grupo de usuários de metformina, o risco de intensificação do tratamento foi 68% maior entre os usuários de SU, 61% entre os TZD e 62% entre os DPP4. Também quando comparados ao grupo metformina, os usuários de SU apresentaram um risco maior de eventos cardiovasculares, ICC e hipoglicemia. 
 
E não termina aí 
 
Em um outro estudo retrospectivo (Bannister CA, Holden SE, Jenkins-Jones S, et al. Can People With Type 2 Diabetes Live Longer Than Those Without? A Comparison of Mortality in People Initiated With Metformin or Sulphonylurea Monotherapy and Matched Non-diabetic Controls. Diabetes Obes Metab. 2014;16:1165-1173), os pesquisadores utilizaram o banco de dados do United Kingdom's Clinical Practice Research Datalink para identificar pacientes diabéticos que haviam iniciado monoterapia com metformina ou SU entre 2000 e 2012 e mantido o tratamento por pelo menos 180 dias. Estes indivíduos foram então comparados a pessoas não-diabéticas segundo idade, sexo, história de câncer e tabagismo; e todos foram acompanhados por mais de 5 anos para comparar a mortalidade subsequente. 
 
Ao todo, foram incluídos mais de 78 mil pacientes em uso de metformina e mais de 12 mil em uso de SU – e um número equivalente de controles. Os usuários de metformina eram significativamente mais jovens e mais obesos que os de SU. 
 
Uma vez mais, os índices de óbito foram beem menores no grupo metformina em relação ao grupo SU (14,4 versus 50,9 por 1000 pessoas-anos). Após ajuste para múltiplas variáveis, o tempo de sobrevida foi 38% menor entre os usuários de SU. E todas as comparações de subgrupo também favoreceram o grupo metformina. Mas a maior surpresa ainda estava por vir... ! 
 
Os pesquisadores descobriram que o tempo de sobrevida na população controle era 15% menor que o observado na contraparte usuária de metformina. Este achado foi consistente em todos os subgrupos, sempre com boa significância estatística. 
 
Agora vamos aos fatos, com calma. 
 
Estudos clínicos randomizados controlados são o cálice sagrado da investigação médica científica. Entretanto, eles não são capazes de responder todas as perguntas importantes sobre vantagens relativas de uma droga sobre a outra. Os estudos de medicamentos costumam ser muito curtos para identificar até mesmo efeitos de médio-prazo sobre a evolução dos pacientes. 
 
Apesar de estudos mais longos estarem sendo realizados para avaliar o perfil de segurança e benefício cardiovascular dos hipoglicemiantes orais, até mesmo eles podem estar sendo controlados demais, a ponto de excluírem variáveis que refletiriam de modo mais acurado o uso dos novos hipoglicemiantes na prática diária. 
 
Se a metformina reduz de verdade a mortalidade, essa é uma pergunta que provavelmente não será respondida nem mesmo após um duradouro estudo clinico randomizado controlado. O que fica registrado é que temos ainda muito a aprender sobre os hipoglicemiantes orais - e que a boa e velha metformina continua firme, forte e saudável na parada.