04 outubro 2016

O HOMEM PARTURIENTE

* Especial para Manhood Brasil


A barriga não era sua, mas você ajudou. Você estava lá, no instante da anfimixia. Ou pelo menos um representante seu estava, nadando mais rápido que o Phelps para entregar o pacote de 23 cromossomos que ajudaria a montar o bebê.

Nove meses se passaram. Sua mulher teve náuseas, azia, estrias, inseguranças estéticas, alterações anatômicas e peculiaridades alimentares, e então alguma coisa na barriga dela começou a se mexer após algumas semanas. Finalmente, depois da longa espera, entre o deslumbramento e o desespero, está chegando o momento. Você vai ser pai.

Está pronto? Espero que sim. Mas, se achar que não está, preparei um roteiro para o seu checklist de vôo. Confira:

AS PRELIMINARES SEMPRE SÃO IMPORTANTES

Por muito tempo, o parto foi uma atividade estritamente feminina. Ao pai, cabia a tarefa de perambular pela sala de espera até receber a notícia da chegada de sua prole. Ele distribuía sorrisos amarelos e charutos cancerígenos, recebia tapinhas nas costas e a enfermeira lhe informava: "é um menino!" ou "é uma menina!". Todos sorriam. Talvez a mãe nem tanto, devido às dores do parto, mas a maioria sorria.

Bem, as coisas mudaram um pouco... Hoje, muitos casais optam pela presença do pai durante todo o processo. Nem todo mundo tem estômago para isso. Tem sangue, agulhas, cheiro de álcool a 70%, a placenta realmente não é uma as coisas mais lindas desse mundo, mas posso dizer que é surreal presenciar seu filho ou filha tomando o primeiro fôlego do resto de suas vidas. Estive lá no nascimento dos meus e recomendo profundamente a experiência.

Ainda que este seja um papel relativamente novo para os homens, isso não significa que você não possa tirá-lo de letra. Se vocês decidiram por um parto na maternidade, as dicas a seguir irão cair como uma luva. Se escolheram um parto em casa, algumas delas serão redundantes ou desnecessárias.

Como preliminares, recomendo que você leia matérias, assista vídeos, questione seus amigos e amigas, compre um livro de colorir com figuras de crianças nascendo e pinte tudo com canetinha hidrocor. Vá às consultas, converse com o médico, estude a Caderneta da Gestante, debata com sua esposa sobre como vocês esperam conduzir o show.

Ela quer você presente? Quer que você segure a mão dela? Quer que tire fotos e publique no Facebook, ou prefere um filme em Full HD para editar um mega documentário para o Netflix? Eu não recomendaria o filme. Entretanto, como a parte dela está bem definida - é ela quem estará tendo o bebê -, resta determinar o que você estará fazendo como coadjuvante. Prepare-se emocionalmente e seja parceiro.
  
ARRUMANDO A SUA MALA

A mala do bebê deve ser planejada como uma rota de fuga para o caso de terremotos e ciclones. Quando chegar a hora, não adianta querer socar intempestivamente a mobília inteira da casa dentro daquela frasqueira rosa ou azul. Ajude a preparar a mala do bebê, da sua esposa e a sua. Sim, a SUA mala - ou pelo menos uma mochila com as suas coisas. Deixe-a pronta e à mão. Assim, quando o alarme soar, basta pegar e ir.

Coloque em sua mochila:

1. LANCHES.  Alguns caras desmaiam por frescura ou emoção, alguns desmaiam por fome mesmo. Com toda a excitação vibrante, você pode esquecer de comer. Não corra o risco de deixar sua glicose baixar no momento mais crítico. Leve consigo alguns biscoitos, chocolate ou barras de cereal.

2. LIVROS, REVISTAS, NOTEBOOK, CARREGADOR DE CELULAR. O trabalho de parto pode levar horas. Após a internação, sua esposa pode querer relaxar e quem sabe até tirar uma soneca - o nervosismo pode produzir sonolência como reação de fuga. Ter alguma coisa para distrair-se ajudará você nessas horas. Que tal salvar este texto e ler novamente enquanto aguarda o jogo?

3. UMA BLUSA DE FRIO. Alguns hospitais tem o ar condicionado ajustado em nível polar. O frio pode ser tenebroso, mesmo no verão. Seja prevenido e enfie um agasalho na mochila.

4. UMA CÂMERA. Você está tirando uma foto com o celular e ele vibra com uma mensagem ou alguém liga e ele sai do modo câmera. Colocá-lo em modo avião pode causar desespero em quem está do lado de fora. Quando for entrar na sala de parto, simplesmente deixe seu celular com alguém de sua confiança e leve uma boa e velha máquina fotográfica. Confira se o cartão de memória, as pilhas ou as baterias estão em ordem. Passe a alça de segurança em seu pulso.

5. UMA MUDA EXTRA DE ROUPA, DESODORANTE, ESCOVA DE DENTES E SIMILARES. Depois do nascimento do bebê, sua mulher pode continuar internada por um dia ou dois antes de receber alta. Permaneça ao lado dela nesse período, mas seja um troglodita cavalheiro higiênico: não use o lado B da cueca. Leve uma muda de roupa, tome um banho, faça a barba, escove os dentes e mantenha-se apresentável. Tomar um banho e colocar uma roupa mais leve e confortável renovará seu ânimo.

NA MARCA DO PÊNALTI

Assim que entrarem no hospital, você deve agir como um treinador do lado de fora do campo. Sua mulher precisará de todo o seu apoio. Você pode estar tenso, mas lembre-se: é ELA quem irá que passar pela parte mais difícil.

1. JOGUE NO MEIO CAMPO. Cuide da parte burocrática, preencha os papéis, carregue as malas, ligue para o obstetra que vocês escolheram (se este for o caso), converse com as enfermeiras, tome as decisões que forem necessárias e veja se tem algo que sua esposa esteja precisando. Faça sua parte com serenidade e parcimônia e JAMAIS obstrua ou complique o trabalho da equipe.

2. PASSE PARA A DEFESA. Pode ser que o parto seja aquele clichê que os filmes gostam de mostrar, com suor, crises cíclicas de dores e gritos. Se tudo correr bem, não há muito que você possa fazer. Assuma uma posição de retaguarda, abra caminho para quem sabe o que está fazendo, segure a mão de sua esposa e procure transmitir calma e confiança.

3. AVANCE COM CAUTELA PELAS LATERAIS. No momento das contrações finais ou da retirada do bebê pela incisão (no caso de cesarianas), você pode se esticar um pouco pelos lados do campo cirúrgico e admirar o nascimento. Mova-se com suavidade e tome um extremo cuidado para não contaminar o que for estéril.

4. TERMINE COM UM GOL DE PLACA. Se o médico for camarada, ele pode oferecer a você a oportunidade de cortar o cordão umbilical. Este ritual de liberação oficializa definitivamente o nascimento do bebê. Não perca a chance de colocar uma lembrança maravilhosa dessas na sua memória. Eu não perdi e tenho grande orgulho disso. Você também terá, acredite.

VOLTANDO PARA A TERRA

Não se alarme com a aparência do bebê assim que ele tiver deixado o casulo uterino. Recém-nascidos são enrugados como um testículo no inverno, tem a cabeça sem sobrancelhas em formato de cone, uma cor rosa-arroxeada, e vem enlameados com um tipo de maionese imprópria para consumo. Não se espante: logo ele terá uma aparência menos esquisita. Diga para sua esposa "que coisa mais linda!" e respire fundo. Com alguma sorte, ele herdará a beleza dela mais tarde.

1. AJUDE O ALEITAMENTO. O bebê deverá mamar em até 1 hora após o nascimento. Apesar da imagem de um bebê ao seio ser uma das coisas mais comuns do mundo, a primeira mamada em geral ocorre de modo tão natural e desembaraçado como você na primeira vez que fez sexo. O lance todo pode ser confuso, sua esposa pode ficar angustiada enquanto vê o bebê decidindo entre respirar e engolir. Felizmente, sua presença prestativa pode trazer paz à cena. Ofereça ajuda, coloque um travesseiro ou apoio sob o braço dela, ajude a posicionar o bebê e reassegure-a que está tudo bem. Não, você não precisa mamar no outro peito para mostrar ao bebê como é que se faz.

2. AJUDE NO BANHO DO BEBÊ. Aprenda e aproveite. O banho é uma atividade de cunho prático e importante para estreitar laços. Entenda como cuidar do umbigo e descubra SUA maneira confortável e segura para fazer a higiene daquele pequeno milagre sugador de leite

3. TROQUE FRALDAS. Sua esposa estará cansada pelo desgaste do parto e serão muitas, muitas, muitas fraldas. Um recém-nascido usa cerca de 6 a 10 por dia, ou mais. Observe e desenvolva uma técnica eficaz para fazer esse Pit Stop. Guarde em um saco plástico as fraldas que você trocar e informe à enfermeira antes de jogá-las fora - isso é importante para monitorar a alimentação do bebê.

4. LIMITE AS VISITAS. Vai por mim: é um evento alegre e de grande felicidade e tudo mais, mas sua mulher não quer nem saber das visitas. Talvez a mãe ou uma irmã para dar uma mão, mas ela certamente não quer um desfile de 7 de setembro no quarto. Seu papel é orientar amigos e familiares e solicitar entendimento e respeito pelo descanso dela e do bebê. Eles terão tempo mais que suficiente para visitar a criança em casa até que ela se torne adulta e vá morar fora. Seja educado e não se preocupe com os "sentimentos" dos visitantes - o conforto de sua mulher e do bebê devem ser sua prioridade máxima.

5. SE VIRE NOS TRINTA. A passagem pelo hospital é uma experiência paralela à realidade: médicos, enfermeiras, amigos, família, padrinhos, madrinhas, conhecidos, o cachorro do vizinho e uma manada de gnus chegam e saem o tempo inteiro. Checagens, pesagens e orientações são uma avalanche, mas eventualmente vocês terão alta e irão para casa. Certifique-se de arrumar o banco do carro para permitir conforto à sua mulher, instale um equipamento adequado para transporte do bebê e dirija com cautela. 

No momento em que descarregar toda a tralha e fechar a porta de casa, a realidade atingirá você como um raio. O bebê chegou para ficar, fera. Não é brincadeira. Contemple sua criação e mostre que o Homem em você é capaz de assumir essa nova missão. É hora de ser Pai.

03 outubro 2016

O HOMEM GRÁVIDO

 * Especial para Manhood Brasil

A sociedade tem todo um discurso politicamente correto sobre igualdade entre os gêneros que funciona muito bem até o pneu do carro furar, ou alguém ter que matar uma barata voadora, ou passar por uma TPM (Tempestade Pré-Menstrual), ou você receber a notícia de que sua mulher está grávida. Em momentos como esses, as diferenças entre os sexos tendem a se tornar inquestionáveis e avassaladoras.

A gravidez, em especial, mostra o grande divisor de águas que existe entre homens e mulheres. Uma vez ocorrida a sacanagem em nível celular - o óvulo dela dormiu com seu espermatozoide -, sua mulher passará os 9 meses seguintes gestando um parasita dentro de si e você não terá outra participação biológica mais relevante que ficar observando o processo do lado de fora. Contudo, se você já deixou de ser o bebezão da sua mãe, sua tarefa de procriador não termina no espermatozoide: começa agora a missão de proteger e cuidar do bem estar de sua mulher e de sua cria em formação.

A gestação é um desafio. Sua fêmea passará por transformações e irá sofrer de várias maneiras diferentes. Ver você com cara de pateta sem saber o que fazer não alivia o fardo dela - na verdade, isso tende a piorar a situação. Alguns sujeitos, por medo ou ogrice, abrem mão de uma participação construtiva nesse período, e isso não é NEM DE PERTO o que se espera de um Homem.

Ao invés de ficar perdido na floresta fazendo cara de paisagem, que tal assumir um papel de líder e apoiador? ISSO sim, é o que se espera de um Homem. E vou lhe contar como fazer isso.

COMO CUIDAR DA SUA MULHER GRÁVIDA

É possível dividir seus cuidados em 10 ações práticas. Confira a lista abaixo e certifique-se de ter um desempenho impecável em cada um deles:

1. RECEBA BEM A NOTÍCIA. Não interessa se foi tudo planejado nos mínimos detalhes ou se o bebê caiu na sua vida como um meteoro vindo das profundezas do espaço. Você está para ter um filho (ou filha). Mostre apreço e alegria pela notícia. Não desabe chorando em agonia, ou desgosto, ou pouco caso, ou fique perguntando o que deu errado - "você não estava tomando a pílula, pô?". Transmita confiança e segurança. Seja Homem. Diga que você estará lá por ela e pela criança, e que não medirá esforços para que tudo corra bem.

2. LEIA LIVROS E TEXTOS SOBRE A GRAVIDEZ. A raiz do medo está no desconhecido - tememos aquilo que não sabemos. Quanto mais você se informar sobre o que ela está passando, melhor equipado você estará para desenvolver empatia e oferecer ajuda.

3. ACOMPANHE-A NAS CONSULTAS. Isto atende 3 propósitos. Primeiro e mais importante: mostra seu nível de compromisso com ela e com o bebê. Segundo: você saberá em primeira mão o que está acontecendo e como se preparar. Sua mulher pode estar nervosa e perdida durante o atendimento. Preste atenção ao que o médico ou a enfermeira irão dizer, anote o que achar relevante e tire suas dúvidas. Você poderá lembrar sua mulher mais tarde sobre as orientações recebidas. Finalmente, ver o ultrassom, ouvir os batimentos cardíacos, aprender a palpar a barriga e determinar a posição do bebê ajudará a você a desenvolver um vínculo emocional com aquela criatura - que é um produto da sua vida e de quem você é. Mesmo que esteja atarefado, dê um jeito e vá às consultas. Peça um atestado ao médico, se for necessário. Eu nunca nego um desses.

4. DIMINUA O ESTRESSE. Não subestime o desgaste físico e emocional de uma gravidez. Diminua a pressão, assuma mais tarefas em casa, assuma suas responsabilidades.

5. PROTEJA O DESCANSO DELA. O sono na gestação pode ser tão monumental quando conturbado, especialmente quando o útero assume aquele aspecto redondo, volumoso e alienígena. Quando a mulher deita de costas, o bebê comprime sua coluna, os músculos das costas e todos os grandes vasos sanguíneos que passam por ali. Tudo isso pode causar dor, redução da circulação e dificuldade para dormir. Além disso, o bebê pode usar o útero como um saco de areia onde ele insiste em treinar golpes de MMA - imagine como deve ser dormir tomando socos e pontapés na barriga pelo lado de dentro... Para ajudar no sono de sua mulher, invista em um bom colchão e travesseiros enormes, ofereça massagens nas costas, carinho e, dependendo da animação dela, alguns orgasmos.

6. SEJA PACIENTE. As variações hormonais são um saco. Um dia ela se sente fantástica, afetuosa e sexy. Dois minutos depois, está chorosa ou quer arrancar a sua cabeça do corpo. A libido dela também entrará numa montanha russa, tendendo a desaparecer no primeiro trimestre, aumentar no segundo e então diminuir novamente no terceiro. Paciência, amigo. Paciência.

7. CONHEÇA SUA NOVA AMIGA: A BEXIGA. Como uma gangue do MST, o bebê vai se assentando e ocupando espaços na pelve da mulher a medida que cresce. A primeira vítima dessa invasão é a bexiga, que perde espaço e capacidade de armazenagem. A cada 20-30 minutos, ela sairá correndo desesperada procurando um lugar para urinar. Seja compreensivo, mantenha o caminho do banheiro livre e iluminado, e crie sempre uma rota de fuga quando derem uma saída.

8. ENGRAVIDE TAMBÉM. Não estou dizendo pra você colocar um monte de roupa debaixo da sua blusa e andar por aí com as mãos na cintura, feito um bule. A intenção é fazer você adicionar ou abandonar alguns hábitos, oferecendo apoio moral. Por exemplo: não reclame que agora vocês não poderão acampar no Kilimanjaro ou pular de asa delta juntos. Crie programas adaptados ao novo cenário.

9. NÁUSEAS E ENJÔOS. Os enjoos são, provavelmente, uma das piores partes da gravidez. Eles afetam 75% das mulheres e costumam ser mais intensos pela manhã. O mal estar em geral desaparece por da 12-15a semana de gestação, mas algumas mulheres ficam nauseadas a gravidez inteira. Ofereça alimentos leves (p.ex.: chá de menta com biscoito de água e sal), mantenha os ambientes arejados, cuide de sua própria higiene (gestantes tem um clássico problema com cheiros, então escove bem os dentes e cuidado com perfumes e desodorantes fortes) e seja flexível (adapte o cardápio ao novo paladar dela).

10. DESLUMBRE-SE COM O MILAGRE. Acima de tudo, encante-se com o fato de que vocês produziram juntos uma improbabilidade estatística. Naquela noite (ou dia), havia uma única chance em 44 bilhões para que a exata configuração de genes que resultou naquele bebê tivesse ocorrido. A codificação molecular resultante daquele evento singular obedeceu a princípios atômicos e propósitos evolutivos que você jamais será capaz de compreender plenamente. A concepção é incrível, inacreditável, absurda, surreal. E você nem precisa acreditar nela para perceber isso: basta esticar a mão cuidadosamente à noite e tocar o pequeno milagre bem ali, confortavelmente escondido nos recônditos da barriga de sua mulher.