24 maio 2018

SOBRE A FILOSOFIA PRÉ-SOCRÁTICA

Costuma-se dividir a Filosofia em quatro períodos distintos:
1. Filosofia Antiga (subdividida em Pré-Socrática, Clássica e Helenística)
2. Filosofia Medieval
3. Filosofia Moderna (subdividida em Renascimento, Racionalismo Clássico e Iluminismo) e
4. Filosofia Contemporânea.

Na Filosofia Antiga, dentre os Pré-Socráticos, seis merecem algum destaque histórico:
1 - Tales (624-556 a.C.)
2 - Anaximandro (610-547 a.C.)
3 - Pitágoras (580-497 a.C.)
4 - Heráclito (540-470 a.C.)
5 - Parmênides (530-460 a.C.), e
6 - Protágoras (485-415 a.C.)

Sócrates nasceu em 469 a.C., quando Parmênides tinha 61 anos de idade e Protágoras, 16 anos. Portanto, Parmênides e Protágoras não são exatamente “pré-socráticos”, mas por conveniência considera-se assim.

O problema com os filósofos deste período é a absoluta falta de registros escritos relevantes de sua própria autoria. Por exemplo:

Nenhum dos escritos de Tales de Mileto sobreviveu até nossos dias. Ainda assim, existem fatos geométricos cujas demonstrações são atribuídas a ele, bem como a dedução de que “o mundo evoluiu da água por processos naturais”, a previsão de eclipses solares e experiências com magnetismo.

Anaximandro, discípulo de Tales, escreveu um livro (intitulado “Sobre a Natureza”), contudo esta obra se perdeu. Ainda assim, a ele são atribuídos a confecção de um mapa do mundo habitado, a introdução na Grécia do uso do Gnômon (relógio solar) e a medição das distâncias entre as estrelas e o cálculo de sua magnitude. Também diz-se que Anaximandro acreditava que o princípio de tudo era o ápeiron - uma matéria infinita da qual todas as outras se cindem -, e que o mundo é constituído de contrários que se auto-excluem o tempo todo.

Tudo que sabemos de Pitágoras também se deve à tradição oral, pois ele nada deixou escrito. Ainda assim, atribui-se a ele a criação do nome Matemática e o argumento de que “a essência, que é o princípio fundamental que forma todas as coisas, é o número”.

Heráclito, que morreu após tentar se tratar de uma possível insuficiência renal ou insuficiência cardíaca congestiva mergulhando em um monte de esterco por orientação de um curandeiro, é creditado pelo aforismo “Panta Rei” (tudo flui) – que não é atestado nos fragmentos conhecidos da obra dele mesmo, podendo mais razoavelmente ser atribuído ao seu discípulo Crátilo. No final das contas, dos escritos de Heráclito sobraram apenas fragmentos, que geraram uma infinidade de obras explicativas.

O único trabalho conhecido de Parmênides é um poema, também chamado Sobre a Natureza (como o livro perdido de Anaximandro), que sobreviveu aos pedaços. Dos fragmentos, concluiu-se que Parmênides defendia três coisas: (1) a Unidade e a imobilidade do Ser (o Ser é uno, eterno, não-gerado e imutável); (2) que o mundo sensível é uma ilusão e não se deve confiar no que se vê; (3) e que a essência das coisas não muda.

Finalmente, sabemos de Protágoras mais pelo que Platão disse e de algumas referências de Aristóteles aos seus ensinamentos que dele mesmo. Existem notícias de que que deixou escritos dois livros: As Antilogias e A Verdade, dos quais é possível encontrar apenas citações e longas discussões a respeito.

Todos estes filósofos receberam os créditos de suas ideias através de registros Doxográficos. Doxografia consiste basicamente na opinião de terceiros e um terceiro pode creditar a você a opinião que bem entender, algo que é bastante prático: caso a opinião não tenha qualquer valia, o descrédito não é do outro, mas seu.

Observando com um viés de saudável ceticismo científico, a filosofia pré-socrática se assemelha a uma coletânea de mitologias. Algumas com fundamentos aproveitáveis, mas a maioria com valor apenas de registro histórico de que alguém - cuja identidade real deve ser considerada obscura por uma questão de honestidade intelectual - pensou certas coisas. Acreditar em Doxografia como referência autoral sugere uma ingenuidade quase religiosa.

Por tudo isso, estudar os pré-socráticos não significa estudá-los per se, mas simplesmente conjecturar a respeito do que foi conjecturado a respeito deles por terceiras ou quartas partes. Algo como fofocar a respeito da fofoca que você ouviu fofocarem algum dia, em algum lugar.

Em não sendo ideias com autores indubitavelmente identificáveis, caso você tenha algum interesse pelas percepções do período Pré-Socrático, me parece mais apropriado debatê-las como conceitos gerais e não especificamente como pareceres emitidos por um ou outro autor, visto que considerar cada um destes como instituidor legítimo dos entendimentos que lhes são atribuídos está mais para um ato de credulidade espiritual que qualquer outra coisa.

Acreditar que Parmênides ou Pitágoras disse isso ou aquilo é como debater sobre a análise sintática das frases ditas pela cobra que conversou com Adão no paraíso. Não é um exercício de filosofia como ciência, mas de filosofia como uma procissão de fé.

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