30 novembro 2017

AINDA SOBRE EDUCAÇÃO NO BRASIL

No primeiro dia de 2015, a presidente recém empossada Dilma Rousseff definiu o novo lema de governo: Brasil, Pátria Educadora. Curiosamente, em novembro do mesmo ano, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) lançou seu relatório Education at a Glance.

O Education at a Glance é uma fonte validada de informações acuradas sobre o estado da educação em todo o mundo. Ele fornece dados sobre o desempenho das instituições de ensino; o impacto do aprendizado nos países; os recursos financeiros e humanos investidos em educação; o acesso, a participação e a progressão na educação; e a organização e o ambiente de ensino dentro das escolas.

No painel de 2015, a OCDE apontou alguns indicadores preocupantes no ensino brasileiro. Por exemplo: o nível de aprendizado médio dos estudantes em Ciência foi péssimo. Entre os avaliados, 82% ficaram entre o nível mais baixo de conhecimento e o nível 2 – o nível básico. A média da OCDE para esses grupos é de 46% no total.

Importante salientar que o nível 2 de aprendizagem em ciências é o mínimo necessário para se tornar um cidadão “crítico e informado”. Nesse nível, os estudantes começam a demonstrar as competências que vão permitir que participem efetivamente e produtivamente nas situações cotidianas relacionadas a ciência e tecnologia. Com 82% dos estudantes com nível baixo de conhecimento científico, não é preciso uma dedução complexa para calcular o naipe de raciocínio crítico que nossa população possui...

Em leitura, o Brasil ficou entre os 12 piores países, com uma média de 407 pontos - bem abaixo da média de 493 da OCDE.

Mas nosso pior desempenho geral foi em Matemática, disciplina em que ficamos entre os cinco piores países avaliados, com uma média de 377 ante uma média de 490 entre os países da OCDE. Basicamente, 70% de nossos estudantes estão abaixo do nível 2 em Matemática – que seria o mínimo necessário para que um aluno possa exercer plenamente sua cidadania. Em países desenvolvidos, como a Finlândia, a taxa de incapazes é de 13%.

“Países como a Colômbia e o México, que tinham resultados similares aos nossos, nos deixaram para trás. Portugal e Polônia, que também estavam próximos, deram um salto de qualidade e superaram a média da OCDE” – e estas não são palavras minhas. São da Secretaria Executiva do MEC.

NÃO É UM PROBLEMA DE QUANTIDADE...

Talvez o problema da qualidade da educação esteja nos investimentos, não? Talvez nós estejamos gastando pouco com isso...

Não, não estamos gastando pouco. O Brasil destina 17% dos seus gastos públicos à educação, do nível de educação básica à educação superior. Somente o México e a Nova Zelândia – ambos com 18% - destinam uma proporção maior dos gastos públicos às instituições de ensino.

Além disso, o gasto público em instituições de educação superior como percentual do gasto público total aumentou 49% entre 2005 e 2012, o que é bem acima do aumento médio da OCDE de 33%. O aumento foi ainda mais acentuado em instituições de ensino fundamental e médio. A proporção de gasto público nesses níveis aumentou 82% no mesmo período, o maior aumento entre todos os países e parceiros da OCDE com dados disponíveis.

Em 2012, o gasto público brasileiro em instituições da educação básica a superior representou 5,6% do PIB. Essa proporção é consideravelmente maior que a média OCDE de 4,7%, e é a quinta mais alta entre todos os países e parceiros da OCDE com dados disponíveis.

Neste ponto, vamos fazer um parêntese e supor o seguinte: eu lhe dei 30 mil reais e pedi que você comprasse um carro para mim. Trinta mil mangos não é uma fortuna, mas também não é de se jogar fora. Contudo, antes que você saísse, eu lhe passei algumas instruções específicas sobre a compra: com esse dinheiro, você deveria retornar trazendo um carro zero quilômetro, com direção hidráulica, automático, trio elétrico, teto solar, 6 air-bags e tração nas quatro rodas - com ABS.

Trinta mil não compram isso. Ainda que seja um dinheiro legal, é pouco para a qualidade definida para o produto. E aqui entra um dos problemas do nosso ensino. Ele não é tanto de quantidade dinheiro, mas de destino do investimento: os salários iniciais dos professores no Brasil são menores do que em outros países latino-americanos como Chile, Colômbia e México para todos os níveis educacionais, desde a pré-escola até o ensino médio.

No Brasil, um professor da rede pública ganha em média R$ 3,3 mil e nós, os hipócritas esquizofrênicos, alucinamos com a suposição de que uma mão de obra desse valor é capaz de ter o mesmo rendimento de um professor da Finlândia. É uma piada. O salário médio de um professor primário finlandês é de  3.132 euros mensais (cerca de R$ 12 mil). Professores do ensino médio recebem 3.832 euros e docentes de universidades ganham em média 4.169 euros por mês (R$ 16 mil).

Se você quer pagar R$ 3,3 mil por um carro, não se surpreenda quando ele não tiver o rendimento de um veículo 5 vezes mais caro. Por R$ 3,3 mil mensais você não compra o direito de possuir uma Ferrari, ainda que os delírios anotados na Constituição Federal e as crenças socialistas-comunistas de banânia tentem lhe convencer do contrário.

Como diz a expressão americana da década de 1930: Não existe essa coisa de almoço grátis. Se você quer qualidade, pague por ela. Ou faça alguém pagar.

... É UM PROBLEMA DE VALORES

Além da montanha de dinheiro investido em educação não ir para o bolso de quem faz a diferença – professores -, há ainda o problema do desinteresse comatoso da população brasileira, que não vê no estudo e no aprendizado um valor intrínseco, mas apenas uma forma para ganhar dinheiro.

Nós não estudamos para aprender. Dizemos o oposto disso apenas como uma maneira dissimulada para ocultar o real motivo pelo qual estudamos: o brasileiro estuda para ganhar mais dinheiro. Transformando o dinheiro - e não a aquisição de cultura e saber – na finalidade do processo escolar, nosso povo deixou de enxergar a educação como algo nobre. Estudar e aprender viraram ferramentas que podem ser indesejadas sem penalidade.

Está tudo bem não estudar caso você esteja satisfeito em levar uma mais simples, certo?

Não, não está.

Em 2013, 54% dos adultos com idade entre 25 e 64 anos não tinham completado o ensino médio no Brasil - o que é consideravelmente maior que a média OCDE de 24% -, e quase dois terços dos jovens de 15 a 29 anos não estavam estudando.

No meio dessa massa de analfabetos funcionais, existe uma multidão absurda que compõe um grupo conhecido como “NEM-NEM”: gentes que nem estudam nem trabalham. Essa multidão - mais de 20% dos indivíduos de 15 a 29 anos - equivale a uma manada de 10,2 milhões de inúteis que a população economicamente ativa deve literalmente carregar nas costas.

A saída para a Educação no Brasil é como a saída para a Saúde, para a Segurança Pública, para o sistema Previdenciário, para a Burocracia e tudo mais que entrava esse país: a saída passa por uma discussão dura, franca, grosseira e com todos os nomes aos bois e palavrões a que se tem direito sobre o que está ocorrendo aqui. Sem espaço para comportamentos de vítima, mecanismos de projeção de culpa, corporativismos cor-de-rosa ou cunhadismos indecentes.

Ou levamos essa joça a sério, ou nos tornamos perpetuamente aquilo que já somos: um bando de sonâmbulos sem competência sequer para limpar o próprio traseiro sem uma ajudinha do Estado.


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