Em uma
pesquisa conduzida pelo Pew Research Center, 85% dos
donos de cães e 78% dos donos de gatos diziam considerar seus animais de
estimação parte da família. Como se
isso não fosse suficiente, a tendência mais recente vem sendo dar
um passo além e tratar o animal como se ele fosse uma criança. Uma
criança humana.
Ora essa, mas quem
é capaz de dizer qual o real valor de um animal de estimação? As pessoas
deveriam ser livres para gastar seu dinheiro com o que bem entenderem, até mesmo com mimos para as traças de suas casas. Que mal há em tratar
um gato ou um cão como uma “criança que nunca irá crescer”, certo?
Não. Não está certo. Nada está certo neste discurso.
As implicações desses hábitos são mais grotescas e
possuem consequências mais vastas do que pode parecer à primeira vista. O antropomorfismo vem ultrapassando
os limites da admissibilidade, assemelhando-se ao que poderia ser
facilmente considerado um distúrbio mental pleno.
QUALIDADES APOTEÓTICAS
Os
caninos, com seus instintos de matilha, alta capacidade de treino, amor
incondicional e lealdade sem julgamento, são de longe os animais de estimação
que mais sofrem antropomorfização. Eles se tornam membros da família, melhores
amigos ou bebês de pelo, e são tratados com refeições gourmets, salões de beleza, colchões ortopédicos e festas de aniversário personalizadas,
entre outros disparates.
A
multidão que diz que “meus cães são meus filhos” age movida por essa crença
animista. Essas pessoas compram presentes de natal, compartilham fotos, pagam cirurgias
cosméticas e fazem o que for necessário para garantir tudo do bom e do melhor
para seus bichinhos. Muitas mulheres conversam SERIAMENTE com seus pets e os chamam de “filhos”, referindo-se a si mesmas como “mamães” deles. Há uns 30 anos, isso equivaleria a marcar
uma consulta com um psiquiatra, mas hoje esta prática é recebida com tolerância e normalidade.
Avançamos?
Louvar
cachorros, gatos, periquitos ou papagaios por serem incapazes de agir como
pessoas más não é somente estapafúrdio, mas também torna o animal uma versão
idealizada e endeusada de nós mesmos – que deve então ser tratada com prendas e
afagos sem fim.
Como um
ser humano, comparativamente mais complexo que um cão ou um gato ou um filhote
de ovelha ou uma cacatua, pode competir com criaturas que personificam todas as expectativas mais singelas de fidelidade, perdão, confiança, amor e inocência?
Na visão de seus donos, quando emparelhados às pessoas, os animais de estimação
são considerados sempre mais puros, mais afáveis, mais lícitos e mais
devotados. São reputados como “espiritualmente superiores”, pois não roubam dinheiro,
não começam guerras e tampouco julgam os outros pelas aparências.
Alguns
podem se defender, por exemplo, dizendo que “cães são filhos para pessoas que
não tem filhos”. Casais e pessoas sozinhas (hetero ou homossexuais, não
importa) que não podem ou não desejam ter filhos em geral migram para animais
de estimação como substitutos da prole humana, engendrando uma família
diferente, mas ainda assim uma família. Estas famílias pet-baseadas podem parecer benignas - afinal de contas, pessoas com
uma mentalidade familiar tendem a ser bons vizinhos, estáveis e voltados aos
interesses da comunidade -, mas não são.
É
verdade que pessoas que não desejam filhos podem se beneficiar ao atuarem como
nutridores e protetores de outra criatura viva. Esse comportamento reduz o
egocentrismo e é louvável. Entretanto, do ponto de vista evolucionário, não
faria mais sentido se estivessem cuidando de uma criatura viva de sua própria
espécie em lugar de um schnauzer?
Independente
do motivo da ausência de filhos – crescimento natural, escolha voluntária ou limitação anatomofisiológica -, essas pessoas
sem filhos ou que não desejam mais tê-los poderiam muito bem optar por atuar
como mentores na vida de crianças humanas reais, ao invés de canalizar todas
suas benquerenças para um angorá. Mas eu entendo a covardia implícita neste desequilíbrio.
Os
níveis de planejamento, investimento, responsabilidade e culpabilidade que
envolvem uma criança humana são infinitamente maiores. Se você machucar
seriamente uma criança - de forma intencional ou não -, é quase indubitável que enfrentará um processo junto ao Ministério Público ou Conselho Tutelar de
sua cidade.
Por
outro lado, você estará agindo dentro da lei se oferecer seu cão para adoção ou
entregá-lo para algum desconhecido via OLX porque está indo trabalhar em outra
cidade e seu apartamento não permite cachorros – ou não quer ter o
trabalho adicional de cuidar de um animal de estimação nesta nova etapa de sua
vida. E, quando ele apresentar alguma doença grave, pode levá-lo para ser
sacrificado em uma clínica veterinária, garantindo uma morte “digna e sem
sofrimento” – isso é ser “humano”.
OPÇÃO PELA SENSATEZ
De uma
perspectiva ambiental, podemos considerar que animais-crianças de estimação
fazem sentido: uma vez que a população humana alcançou números alarmantes,
substituir filhotes humanos por filhotes de outras espécies pode ser uma saída
para controlar o surto de Homo sapiens
no planeta. Não obstante, estaríamos trocando uma epidemia por
outra.
Saem as
crianças, entram os animais de estimação – que não possuem qualquer papel no
ecossistema, além de alimentar as misérias afetivas dos humanos. Se todos nós
fizermos essa opção, você consegue quantificar o impacto disso na economia e na
civilização como um todo? Ou acha mesmo que Rex e Totó irão substituir a
mão de obra, os consumidores, os eleitores, os contribuintes e os inovadores do
futuro?
Eu
prefiro surfe a futebol, carne ao invés de legumes, Pearl Jam ao invés de sertanejo, uísque ao invés de cerveja e isso está ok - são apenas predileções. Todavia,
no momento em que decido me empenhar ativa e exclusivamente no zelo e na defesa de bichos ao invés
de crianças humanas, alguma coisa está errada. Alguma coisa está muito errada e extrapolou as fronteiras da coerência.
Pessoas
que colocam cães ou gatos ou qualquer outro bicho em níveis de relevância acima
de sua própria espécie deveriam rever suas carências emocionais. Elas deveriam
crescer, sair dessa infância cheia de fugas egocêntricas e projeções dramáticas, e
procurar tratamento psicológico.
A verdade pode ser amarga, mas ela merece e deve ser evocada. É hora de repensar o culto aos animais de estimação e o fervor que muitos adultos dedicam ao altar desse fanatismo.
E devemos ter um mínimo de honradez para batizar essa doença como a doença que ela se tornou: o Transtorno dos Adoradores de Animais de Estimação. O bom senso, a razoabilidade e o discernimento que permeiam nossa rala inteligência certamente irão agradecer.
E devemos ter um mínimo de honradez para batizar essa doença como a doença que ela se tornou: o Transtorno dos Adoradores de Animais de Estimação. O bom senso, a razoabilidade e o discernimento que permeiam nossa rala inteligência certamente irão agradecer.
7 comentários:
Excelente artigo, Sandro! Tudo o que eu gostaria de dizer a algumas pessoas quando vejo determinadas cenas. Não entendo essa equiparação de animais irracionais à pessoas.
Outro dia uma amiga chamou o cãozinho de filho, não aguentei e rindo soltei: mas você não é uma cachorra... quase perdi uma amiga...rs.
Acho uma graça os animais, mas sou apaixonada é por gente, seres pensantes. :)
Sinceramente? Seu artigo é tão somente a opinião de quem não gosta de pets. Ponto. Tecer uma tese sobre o assunto ser isso ou aquilo e, o que é pior, achar que pode julgar quem tem opinião diferente chega a ser patético. "O bom senso, a razoabilidade e o discernimento que permeiam a sua rala inteligência" deveria estar mais focado em observar mais atentamente seus colegas médicos que fazem dessa profissão um balcão de negócios; colegas que não se preocupam com ética quando saem por aí vendendo falsos atestados ou inventando problemas onde não há pelo simples fato de estar sendo pago para isso. Preocupe-se com o que de fato merece a sua preocupação e deixe que nós, mães e pais de filhos de quatro patas, decidamos como tratamos nossos filhos. Até porque, isso não é problema seu.
SÃO ESCOLHAS DE CADA UM! Tenho amigos "pensantes" e de 4 patas. Concordo que há pessoas que amam seus animais de forma exacerbada, mas EU ESCOLHO TER UM ANIMAL em minha vida e tenho faculdades mentais o suficiente para separar as relações. Cão é cão, gato é gato e por aí vai...e se um dia alguém me questionar por eu chamar meu peludo de filho, boto prá correr, SIMPLES ASSIM! Pq na hora de pagar minhas contas, nenhum humano vai aparecer. Pronto, tá falado!
"Até porque, isso não é problema seu". Não é dele mesmo. Trata-se de um problema de saúde pública. Os animais de estimação quando deixados soltos pelas ruas e quintais, promovem todo tipo de poluição com seus latidos (no caso dos cães), urina, fezes e demais estragos que promovem nos centros urbanos.
Menos julgamentos e mais compreensão nunca sairão de moda.
Tenho uma amiga que até compra roupas sapatos e até passa talco no seu cãozinho e o põe na cama pra dormir isso já é exagero.
Perfeito!!!
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