© Dr. Alessandro Loiola, 2016
Nunca concordei com o termo "inocência
da infância". Não acho as crianças inocentes. Muito pelo contrário:
vejo-as lúcidas. De uma lucidez como nunca mais teremos na vida.
Uma criança é capaz de convidar os colegas
para irem assistir a um DVD em sua casa, fazer a mãe preparar duas tigelas de
pipocas, desarrumar os móveis da sala para que os 21 pequenos gremlins caibam
na frente da tela da TV e então, poucos minutos depois de iniciada a película,
todo mundo se levanta e vai jogar queimada no playground.
Déficit de atenção e hiperatividade? Nada
disso. Lucidez. Da porta do corredor, a mãe conversa com filho que já se
prepara para descer as escadas acompanhando o restante da manada:
– Vocês não vão terminar de ver o filme?
– Ah, mãe, a gente tava vendo, mas agora o
pessoal que ir brincar de bola.
– Mas vocês nem viram tudo…
– Depois a gente vê. O filme vai estar aqui
em casa mesmo. Tchau!
Soberba, magnífica, puríssima lucidez. Viva
com intensidade cada momento. Amarre todo seu coração no sentimento de estar
aprendendo e fazendo, e não na ganância tola de preservar o que acha que venceu
ou conquistou. Você não conquistou coisa alguma. Alexandre Magno conquistou o
Egito e Pizzarro derrotou os Incas. Não os vejo por aí há algumas semanas… Nós
vamos pelo mesmo caminho.
"Quero-não-quero"
Acima de tudo, jamais questione a lucidez das
crianças. É através dessa montanha russa de "quero-não-quero" que
elas desenvolverão habilidades motoras, senso de liderança e capacidade de
solução de problemas em situações de crise, enquanto se divertem muito, de um
modo como você não sabe mais fazer.
Quando éramos criança, aprender era
magnífico. Um bebê é capaz de se entreter por horas com meia dúzia de
brinquedos simples de plástico. A textura, as cores, as formas. Tocar os
objetos, lamber a tinta tóxica, procurar pequenas peças que possam ser
arrancadas com aqueles dentinhos e ameaçar engolir tudo, para desespero da tia
que acabou de dar o presente de aniversário.
Diversão
Em que ponto nos esquecemos da alegria de
aprender com as dificuldades desse mundo e nos tornamos esse bando de adultos
cegos e chatos?
Com as brincadeiras, as crianças expandem a
compreensão de si mesmas, dos outros e do mundo ao seu redor. Por volta dos 6
meses de idade, elas já desenvolveram um método particular de "tentativa e
erro", e utilizam este mecanismo para avaliar o ambiente e, em alguns
casos, nossa tênue paciência.
À medida que adquire novas capacidades
motoras, são criados esquemas mais complexos. Aos 9 meses de idade, a criança
gosta de empurrar uma bola ou outro brinquedo para vê-lo deslocar-se, e então
se diverte engantinhando atrás dele. Mais ou menos como você faz com sua saúde,
empurrando-a para longe para abrir mais espaço para o dinheiro, e então
engatinhando sobre o dinheiro para ver se alcança a saúde de volta.
Consciência
É apenas a partir dos 2 anos de idade que a
criança começa a tomar consciência das funções dos objetos no seu mundo social.
Ela é capaz de compreender que abridores de garrafas não são chupetas, e que o
telefone serve para falar com outras pessoas.
Com 5 anos, as idéias sobre o mundo social, o
mundo da "gente grande", começam a invadir a brincadeira de
faz-de-conta, que se torna mais complexo, cheio de elementos organizados e
regras. A flexibilidade das brincadeiras se torna um meio para atender às
necessidades intelectuais e sociais do grupo. Por exemplo: escolher um dos
times para jogar ajuda a reafirmar laços de amizades, e ter rapidez de
raciocínio pode ser útil para manipular as regras e tornar a brincadeira mais
divertida para o seu lado.
E as brincadeiras de criança podem ser ainda
mais construtivas se você for capaz de ajudá-las por meio de três princípios
básicos:
1) Valorize o divertimento da mesma maneira
que você valorizaria um trabalho bem feito. As brincadeiras, assim como a
escola (ou algumas vezes mais que a própria escola), prepararão seu filho ou
filha para os verdadeiros desafios do futuro.
2) Crie uma atmosfera favorável em casa.
Coloque brinquedos e livros educativos sempre ao alcance da criança, mas deixe
também um graveto para o moleque atazanar o formigueiro antes do horário de
almoço. E intervenha para garantir a segurança da brincadeira: conflitos entre
faixas etárias podem resultar em brigas desiguais, e a simples presença atenta
de um adulto pode ser suficiente para coibir comportamentos mais violentos.
3) Finalmente, envolva-se nas brincadeiras de
seus filhos sempre que conseguir. Jogue bola, frisbee, peão, pique-esconde,
tome chá de mentirinha, pule corda, role pelo chão e ria, ria muito. Sua
infância pode ter ficado a décadas de distância, mas a criança dentro de você
irá viver até o último segundo.
Aproveite!
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