Zika Vírus e a cabeça pequena do
mundo todo
Por Alessandro Loiola © 2016
Essa histeria toda acerca de um
vírus. De novo e de novo. Os velhos mesmos cavaleiros do apocalipse e todas as
suas velhas mesmas profecias de terror e inferno. Tivemos a lepra, a peste
negra, a sífilis, a tuberculose, o nazismo, a crise da Baía dos Porcos, os El Niños, o
bug do milênio, o HIV, a gripe aviária, a gripe suína, o H1N1, a Dengue (todo ano desde 1987), o Chikungunya (que ia causar Síndrome de Guillain-Barre em toda a humanidade + 13% de extraterrestres), e agora
desembarcamos no Zika.
Afinal, o que é verdadeiro e o que é
puro pânico? De tanto ser perguntado sobre esse cataclismo no consultório, fui
construir minhas próprias certezas. E o que eu descobri foi que a Terra,
prezado Galileu, parece mesmo ser redonda.
O que é o Zika?
O
Zika é um arbovírus do gênero Flavivírus, aparentado da Dengue, do Chikungunya
(mais fácil escrever do que falar), da Febre do Oeste do Nilo e da Febre
Amarela.
Arbovírus
vem de "Arthropode Borne Virus",
ou vírus transmitidos por artrópodes, e não por acaso todos esses vírus são depositados
em você pela picada do nosso conhecido amigo tropical, o pernilongo.
Até
recentemente, o Zika era apenas um representante obscuro desse clã. Descoberto
na década de 1940, foi batizado com o nome da distante floresta de Uganda onde
os cientistas o identificaram pela primeira vez em um bando de macacos Rhesus.
Até 2013, poucos casos de Zika haviam sido documentados, mas os pesquisadores
começaram a soar alarmes a partir de epidemias em algumas ilhas do Pacífico e
no sudeste da Ásia11,12,14. Em 2015, o drama chegou ao Brasil em
larga escala13.
Foi
aqui que a ideia de que o Zika poderia causar microcefalia começou a ganhar
corpo. A doença pelo Zika é como um quadro gripal banal, sem os riscos de
mortalidade associados à Dengue ou ao Influenza, por exemplo. Todavia, a
despeito das evidências, a notícia começou a correr solta feito fogo novo em mato
seco. "Zika Causa Microcefalia",
estamparam as manchetes. E a OMS, escaldada com a repercussão negativa da
opinião pública ao demonstrar lentidão em reconhecer um surto recente de
Ebola na África15,16,17,18, não tardou para carimbar este arroubo psicótico como uma Emergência Internacional19.
O que é
Microcefalia, afinal?
Em
termos simples, microcefalia significa cabeça pequena. Em palavreado médico,
refere-se a uma má-formação característica percebida em geral já ao nascimento: uma redução
da circunferência do crânio (ou Perímetro Cefálico ou PC).
Um
PC abaixo de 2 pontos do "desvio padrão" significa microcefalia e
sugere um problema de desenvolvimento do cérebro dentro do útero.
Mundialmente,
a incidência de microcefalia primária (detectada ao nascimento) varia de 1,3 a
150 casos para cada 100.000 nascidos vivos/ano1,31, e estudos
retrospectivos estimam que a incidência de microcefalia grave (PC mais de 2
pontos abaixo do desvio padrão) orbite entre 0,54% e 0,56%2 de todos os nascidos vivos. Mas é extremamente difícil determinar um número exato e confiável para
incidência deste distúrbio, dado que ele tende ocorrer associado a outras
doenças (então as notificações correspondem a citomegalovirose ou rubéola
congênita e não especificamente a microcefalia).
Além
disso, ainda que a Microcefalia possa ocorrer associada a síndromes severas e
incapacitantes, esta regra não se aplica a todos os casos. Para dimensionar
melhor o problema, saiba que em 1977 foi realizado um estudo em Seattle avaliando o PC de
1.006 crianças entre 5 e 18 anos de idade. Os pesquisadores descobriram que
1,9% delas apresentavam um PC mais de 2 pontos abaixo do desvio padrão (corrigido
para sexo e faixa etária), mas não foram encontradas diferenças significativas
de QI entre as crianças classificadas como microcefálicas e as demais3.
O que causa
Microcefalia?
Existem
várias, várias, várias causas.
Atente para o fato - ATENÇÃO! - de que
algumas dessas causas podem ser tratadas, garantindo um crescimento normal do
bebê, enquanto outras causas ocorrem associadas a outras má-formações, por
vezes graves, comprometendo o desenvolvimento físico e mental.
As
causas mais frequentes de microcefalia incluem:
• Craniossinostose: os
ossos do crânio estão separados ao nascer. Isso é normal. Essas áreas de
separação são as "moleiras" que os bebê têm. Elas estão ali por um
motivo: para permitir que o cérebro se desenvolva em tamanho e volume com o
tempo. Pode acontecer dessas separações (chamadas "suturas" pelos
médicos) se unirem prematuramente, impedindo o crescimento cerebral - e esse é o transtorno que atende pelo nome de Craniossinostose. O
tratamento consiste na separação cirúrgica desses ossos. Se não houverem outras
má-formações associadas, e caso a cirurgia seja feita a tempo, o
desenvolvimento da criança ocorre normalmente após a cirurgia, sem quaisquer
sequelas para a inteligência. Talvez este seja o caso de Ana Carolina Cáceres. (http://noticias.r7.com/saude/sou-plena-feliz-e-existo-porque-minha-mae-nao-optou-pelo-aborto-diz-jornalista-com-microcefalia-01022016), mas não tenho informações de seu prontuário médico para
afirmar com certeza.
• Alterações Genéticas: a síndrome de Down (Trissomia do cromosomo 21) e uma penca de
outras alterações genéticas podem resultar em microcefalia. E quando digo uma
PENCA, é uma penca mesmo. Basta ver os quadros abaixo.
Fonte: Passemart S et al. Microcephaly. In Handbook of Clinical Neurology,
Vol. III (3a edição),
Pediatric Neurology Part I. Elsevier, 2013.
• Baixos níveis de oxigênio (Anóxia Cerebral): complicações na gestação ou no trabalho parto podem
compromenter o suprimento de oxigênio para o cérebro do feto, resultando em
microcefalia.
• Infecções do feto durante a gestação: tais como toxoplasmose, citomegalovirose, Rubéola, Herpes simples, HIV e
Varicela.
• Exposição a medicamentos e substâncias tóxicas: se a mãe entrar em contato com bebidas alcoólicas, fenitoína, cocaína, carbamazepina, fenobarbital ou ácido valproico, por exemplo, o desenvolvimento fetal
pode ser afetado. E atenção: a lista das substâncias com potencial para causar
microcefalia não é completamente conhecida. Por que? Porque NADA é
completamente conhecido ainda. Não ache isso uma surpresa.
• Desnutrição grave: o
raciocínio é simples. Mãe desnutrida, feto com problemas.
• Fenilcetonúria materna não-controlada: a fenilcetonúria é um defeito de nascença que impede
o organismo de metabolizar o aminoácido fenilalanina. Se a doença não estiver
bem compensada na mãe, o feto pode sofrer as consequências em seu desenvolvimento.
• Causas diversas: hipotireoidismo ou anemia materna, exposição à radiação durante a gravidez, diabetes não-compensado,
insuficiência placentária, hipertermia, acidente vascular cerebral...
• Tendências familiares: não ria. É tão sério quanto óbvio. O tamanho da cabeça dos pais
deve ser medida para determinar se o padrão "microcefálico" é um
traço que corre na família.
Como diabos o Zika foi associado à
Microcefalia?
Aqui começa
a carne de pescoço. Para quem não gosta de ciência e prefere a fé das crenças
cegas, dos desígnios divinos, dos relatórios oficiais, e se recusa a raciocinar
de forma independente, um alerta de spoiler: o resto deste texto não é para
você. Pule para uma página da Disney ou da Igreja de sua preferência.
Em 2013 e
2014, foram documentados respectivamente 167 e 147 casos de microcefalia no
Brasil. Entretanto, em 2015, o Ministério da Saúde contabilizou um aumento
exponencial nesse número, com 2.782 casos "notificados" antes do fim
do ano. Um aumento de 1.792%! Realmente, algo digno de nota. Mas entenda que
são casos SUSPEITOS de microcefalia. Não se tratam de casos 100% CONFIRMADOS. Na sequência desse devaneio, Schuler-Faccini et al
publicaram um artigo4 que é um primor de credulidade.
O texto informa:
"No começo de 2015, após observarem um
aumento no número de casos de microcefalia em áreas afetadas pelo Zika, e
considerando o isolamento de RNA do Zika-vírua no líquido amniótico de duas (02)
gestantes cujos bebês apresentaram microcefalia no ultrassom pré-natal,
técnicos do Ministério da Saúde designaram uma força-tarefa para monitorarem a
incidência de microcefalia em grávidas com suspeita de infecção pelo Zika.
Foram identificados 35 bebês com microcefalia nascidos entre agosto e outubro
de 2015 em 8 estados diferentes. Todas as mães moravam ou haviam visitado áreas
afetadas pelo vírus durante a gestação. Dos 35 bebês, 25 apresentavam
microcefalia grave (PC mais de 3 pontos abaixo do desvio padrão, corrigindo-se
para sexo e idade gestacional); 17 possuíam pelo menos uma anormalidade
neurológica associada".
O estudo comunica que foram realizados testes para outras infecções congênitas que poderiam causar o problema, mas não informa claramente se foram pesquisadas alterações cromosômicas e se as mães apresentavam outros fatores de risco que pudessem explicar a ocorrência da microcefalia.
"Todos os bebês foram submetidos a uma
punção lombar para análise do líquor e testes para detecção do Zika, mas os
resultados ainda não estavam disponíveis quando da publicação do artigo".
Os pesquisadores concluem que mais estudos serão necessários para confirmar (confirmar?) a associação entre infecção por Zika durante a gravidez e o desenvolvimento de microcefalia, e tece uma série de recomendações para se proteger dos vetores (mosquitos).
Calma lá.
Primeiro: quando dizem
"confirmar" já estão partindo do pré-suposto de que existe, de fato,
um vínculo causal direto. Mas este nexo ainda não foi determinado. “Avaliar”
seria mais adequado.
Segundo: associação NÃO é causa. Pessoas
que infartam possuem cílios, então podemos afirmar que cílios causam infarto e
retirar seus cílios diminuiria o risco de suas coronárias entupirem com grumos de gordura? Isso não é ciência. Isso é
disseminar pânico. Ciência lida com fatos, e não existem evidências suficientes
para afirmar qualquer papel do Zika na gênese da microcefalia.
Recomendações baseadas em intuição podem
ser louváveis, mas estão longe de ser CIÊNCIA. Ciência é um modo de pensar, um
método de raciocínio, e o artigo trata uma suposição quase como um fato
sacramentado. Manchete: "Zika causa
Microcefalia". Péra aê. Pára o mundo e me deixa descer.
Um esclarecimento do Ministério da Saúde28
diz que:
"Ainda não é possível ter certeza sobre a causa para o
aumento de microcefalia que tem sido registrado nos sete estados. Todas as
hipóteses estão sendo minuciosamente analisadas pelo Ministério da Saúde e
qualquer conclusão neste momento é precipitada. As análises não foram
finalizadas e, portanto, continuam em andamento. A correlação entre o aumento
de casos de microcefalia e o Zika vírus é uma das hipóteses que estão sendo
levantadas pela investigações em andamento do Ministério da Saúde".
Segundo o
Ministério28, alguns aspectos fortalecem essa correlação, tais como
"a coincidência temporal da
circulação do vírus, pela primeira vez na história do país, no primeiro
semestre de 2015 com o nascimento das crianças com microcefalia a partir do
segundo semestre... Até o momento, não foi encontrada nenhuma outra causa que
explicasse esse aumento de casos de microcefalia ".
Sim, mas desde quando monitoramos nossas gestantes para esse
vírus?
Outro boletim29 afirma que:
"O
Ministério da Saúde confirmou a relação entre o vírus Zika e o surto de
microcefalia na região Nordeste. A confirmação foi possível a partir da
confirmação do Instituto Evandro Chagas da identificação da presença do vírus
Zika em amostras de sangue e tecidos do recém-nascido que veio a óbito no
Ceará".
De novo? Falando
de associação como se fosse causa? Chamam isso de política de esclarecimento
público?
"As investigações sobre o tema devem continuar para
esclarecer questões como: a transmissão desse agente; a sua atuação no
organismo humano; a infecção do feto e período de maior vulnerabilidade para a
gestante. Em análise inicial, o risco está associado aos primeiros três meses
de gravidez"29.
Outro
documento do Ministério30 - um protocolo de atenção à saúde e
resposta à ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus Zika -,
informa que:
..."Até o momento, foram consolidadas evidências que corroboram a
decisão do Ministério da Saúde no reconhecimento da relação da microcefalia
com o vírus Zika. Constatou-se que os primeiros meses de gestação das
crianças que nasceram com microcefalia corresponderam ao período de maior
circulação do vírus Zika na região Nordeste e que não há correlação com
histórico de doença genética na família ou exames com padrão de outros
processos infecciosos conhecidos".
Vai me
dizer que TODOS os casos suspeitos estão sendo confirmados como microcefalia e
escrutinados para TODAS as causas genéticas e TODOS os fatores ambientais?
Levamos
meses para conseguir um mero eletrocardiograma em um ambulatório do SUS e
querem me convencer que TODOS os exames possíveis foram realizados em TODOS os
casos? Ok, eu me convenço: basta publicar os estudos com as tabelas e os
resultados de análise genética e matriciamento da incidência dos demais fatores
de risco.
Em seguida,
o mesmo documento30 afirma:
“Atualmente a incidência de casos de infecção pelo vírus
Zika impõe a intensificação do cuidado da gestante durante o acompanhamento
pré-natal, devido a uma possível associação com os casos atuais de
microcefalia em recém-nascidos”.
O protocolo
é assinado por 30 pessoas e por nenhuma pessoa - ou “Secretaria de Atenção à
Saúde” é algum funcionário do governo com CPF e identidade? O que é de muitos,
termina sendo de ninguém.
Pessoalmente,
fiquei confuso com esses documentos oficiais. Afinal, o protocolo do Ministério
afirma que há uma relação causal, não há uma relação, pode ser que sim, pode
ser que talvez quem sabe todavia não, ou vice-versa?
Associação
NÃO é causa.
Relação NÃO
é etiologia.
Pré-suposto
NÃO é ciência.
Tá difícil de
entenderem isso... Mas se insistirmos, quem sabe até a próxima passagem do
Halley a ficha caia.
Um pouco de estatística não faz mal
a ninguém
Retornemos
ao ponto em que os textos médicos informam que a
incidência mundial de microcefalia varia de 1,5 a 150 casos para cada 100.000
nascidos vivos, sendo mais ou menos 12 casos/100.000 nos EUA2 e 10
casos/100.000 no Reino Unido20, lembra? E não esqueça que estudos
retrospectivos2 estimam que a incidência de microcefalia grave (PC mais de 2
pontos abaixo do desvio padrão) orbite entre 0,54% e 0,56% de todos os nascidos
vivos.
Vamos lá. Veja a tabela abaixo. Ela
mostra os casos de microcefalia notificados por ano no Brasil e o número de
nascidos vivos em cada ano:
|
2010
|
2011
|
2012
|
2013
|
2014
|
Nascidos vivos no Brasil
|
2.861.868
|
2.913.160
|
2.905.789
|
2.904.027
|
não
disponível
|
Casos notificados de microcefalia
|
153
|
139
|
175
|
167
|
147
|
Porcentual de microcefalia /
total de nascidos vivos
|
0,0053%
|
0,0047%
|
0,0060%
|
0,0057%
|
?
|
Incidência de microcefalia / 100.000 nascidos vivos
|
5,34
|
4,77
|
6,02
|
5,75
|
?
|
Faça
as contas. Se estivéssemos dentro da matemática mundial mínima de 0,54% de
casos de microcefalia para todos os nascidos vivos em um determinado ano, seria
de se esperar que fossem notificados quantos casos anualmente?
Eu
fiz os cálculos para você, pode conferir aí se quiser:
|
2010
|
2011
|
2012
|
2013
|
2014
|
Nascidos vivos no Brasil
|
2.861.868
|
2.913.160
|
2.905.789
|
2.904.027
|
não
disponível
|
Casos esperados de microcefalia
(considerando incidência de 0,54% sobre o total de nascidos
vivos)
|
15.454
|
15.731
|
15.691
|
15.681
|
?
|
A bem da
verdade, os EUA possuem uma incidência proporcional ao esperado: segundo o censo de 2010, os estadunidenses totalizam 308.745.538 pessoas32, com uma taxa anual de natalidade de 13,42/1.000 habitantes33, o que significaria 4.013.691 nascidos vivos/ano. Se aplicarmos a este número a taxa mínima de incidência de microcefalia descrita na literatura (0,54%), esperaríamos uma incidência anual de 21.673 casos de microcefalia. De fato, os dados oficiais dos EUA correspondem a esta estimativa: por lá, são notificados 25.000 casos de microcefalia por ano2.
Por aqui,
notificamos anualmente uma média de 5,47 casos de microcefalia / 100.000
nascidos vivos. Mais ou menos metade da média dos americanos e dos ingleses,
aqueles nortistas subdesenvolvidos. Deve ser porque nosso sistema único de
saúde é um primor de assistência pré-natal com uma base de dados extremamente
acurada e confiável, certo?
Me segue:
uma cirurgia considerada "limpa" (uma cirurgia de hérnia ou um
procedimento plástico-estético, por exemplo) tem 2% a 5% de chance de
contaminação21,22,23,24,25,26,27. Não tem pra onde correr. Você pode
ser dono(a) de um hospital top de linha e seus procedimentos "limpos"
irão cair dentro dessa estatística. Um hospital que possui mais de 5% de taxa
de infecção hospitalar é uma porcaria - eu diria que eles fazem lambança e não
seguem rotinas técnicas básicas, ou coisa pior. Por outro lado, um hospital que
possui menos de 2% também é uma porcaria: isso significa que eles ou não estão
tabulando corretamente os casos de infecção hospitalar ou estão manipulando
números com intuito marqueteiro.
Bem, se o
Brasil fosse um país sério e se tivéssemos técnicos sérios em Ministérios
sérios, com lideranças sérias tomando as medidas sérias cabíveis, não
estaríamos vivendo o déficit recorde de 115 bilhões de reais no orçamento de
20157, produto das análises e decisões super-profissionais de nossas
equipes de mega-especialistas em economia e planejamento.
Se o Brasil
fosse um país sério, teríamos uma incidência de notificação de microcefalia
dentro dos parâmetros de qualidade internacional ao invés da (piada)
extraordinária média anual de 5,47 casos de microcefalia / 100.000 nascidos
vivos.
Um
relatório feito por pesquisadores do Estudo Colaborativo de Malformações
Congênitas (Eclamc) questionou o tamanho do
surto de microcefalia no Brasil8. O Eclamc estima que nossa taxa anual de microcefalia esteja em
torno de 19 casos / 100.000 nascidos vivos.
Em seu documento8, os cientistas
do Eclamc defendem que "um número maior de casos que antes passariam
despercebidos foi notificado, e que podem haver erros de diagnósticos: em lugar
de adotar uma medida contínua, baseada no tamanho médio do crânio das crianças
ao nascer, o diagnóstico deveria observar a velocidade do desenvolvimento do
cérebro".
O excelente
insight dos pesquisadores Ieda Maria Orioli e Jorge Lopez-Campelo foi esquecido
pela mídia e ignorado pela abordagem alarmista das organizações de saúde
internacionais e pelo governo brasileiro.
A verdade é
que revivemos ainda a Idade Média em círculos infinitos - o mundo é redondo,
afirmou Galileu, e não é à toa. Cada novo avanço da "ciência médica"
é como uma reimpressão do Malleus Maleficarum9. Cada novo governo em
nosso país é uma reedição das Capitanias Hereditárias e seus mecanismos de
vassalagem e cunhadismo.
Não é
difícil perceber que a preguiça de pensar e a incompetência intelectual
involuntária têm impedido sistematicamente a opinião da massa de reconhecer as
suas limitações. Pra mim, essa pode ser a
resposta para 99% dos males que nos afligem.
Mas o reverso pode ser verdadeiro: talvez seja
EU quem está sob uma espécie de Efeito Dunning-Kruger10, onde "pessoas burras são burras até para conseguirem perceber que são burras".
Vai saber.
Esperemos
pelo Zika.
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