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Alessandro Loiola
Com
tantos remédios novos para tratamento do diabetes melito, a Metformina deve
continuar sendo uma das primeiras escolhas? Para
responder essa pergunta, um estudo observacional recente procurou determinar o
efeito inicial de classes diferentes de hipoglicemiantes orais e a necessidade
de terapia subsequente com outros hipoglicemiantes (Berkowitz SA, Krumme AA, Avorn J, et al. Initial
Choice of Oral Glucose-Lowering Medication for Diabetes Mellitus: A
Patient-Centered Comparative Effectiveness Study. JAMA Intern Med. 2014 Oct 27).
Foram
incluídos mais de 15 mil pacientes sem antecedente de intervenção prévia para
diabetes e que haviam iniciado tratamento com metformina, sulfonilureia (SU),
tiazolidinediona (TZD) ou inibidor de dipeptidil peptidase (DPP4). O desfecho
primário foi o tempo até intensificação do tratamento, definido como adição de
uma classe diferente de hipoglicemiante oral. Os desfechos secundários
incluíram intervalo até eventos cardiovasculares (coronariopatia, ICC, angina
instável, AVC isquêmico, IAM ou procedimento de revascularização miocárdica),
ICC isoladamente, atendimento em um serviço de Urgência & Emergência
(U&E) devido hipoglicemia, e qualquer outro atendimento de U&E devido
problemas relacionados ao diabetes.
E a campeã foi... Metformina !
No grupo inicial de pacientes, 58% iniciaram o
tratamento com metformina, 24% com uma SU, 6% com um TZD e 13% com um DPP4.
Durante cerca de 1 ano de acompanhamento, observou-se uma diferença
significativa de intensificação do tratamento entre as classes medicamentosas. Dos
pacientes em uso de metformina, 25% necessitaram um segundo hipoglicemiante
oral, comparados a 37% do grupo SU, 40% dos TZD e 36% dos DPP4.
Com relação ao grupo de usuários de metformina, o
risco de intensificação do tratamento foi 68% maior entre os usuários de SU,
61% entre os TZD e 62% entre os DPP4. Também quando comparados ao grupo
metformina, os usuários de SU apresentaram um risco maior de eventos
cardiovasculares, ICC e hipoglicemia.
E não termina aí
Em um
outro estudo retrospectivo (Bannister CA,
Holden SE, Jenkins-Jones S, et al. Can People With Type 2 Diabetes Live Longer Than Those
Without? A Comparison of Mortality in People Initiated With Metformin or
Sulphonylurea Monotherapy and Matched Non-diabetic Controls. Diabetes Obes Metab. 2014;16:1165-1173), os pesquisadores
utilizaram o banco de dados do United Kingdom's Clinical Practice Research
Datalink para identificar pacientes diabéticos que haviam iniciado monoterapia
com metformina ou SU entre 2000 e 2012 e mantido o tratamento por pelo menos
180 dias. Estes indivíduos foram então comparados a pessoas não-diabéticas
segundo idade, sexo, história de câncer e tabagismo; e todos foram acompanhados
por mais de 5 anos para comparar a mortalidade subsequente.
Ao
todo, foram incluídos mais de 78 mil pacientes em uso de metformina e mais de
12 mil em uso de SU – e um número equivalente de controles. Os usuários de
metformina eram significativamente mais jovens e mais obesos que os de SU.
Uma vez
mais, os índices de óbito foram beem menores no grupo metformina em relação ao
grupo SU (14,4 versus 50,9 por 1000 pessoas-anos). Após ajuste para múltiplas variáveis, o tempo de sobrevida foi 38%
menor entre os usuários de SU. E todas as comparações de subgrupo também
favoreceram o grupo metformina. Mas a maior surpresa ainda estava por vir... !
Os
pesquisadores descobriram que o tempo de sobrevida na população controle era
15% menor que o observado na contraparte usuária de metformina. Este achado foi
consistente em todos os subgrupos, sempre com boa significância estatística.
Agora vamos aos fatos, com calma.
Estudos
clínicos randomizados controlados são o cálice sagrado da investigação médica
científica. Entretanto, eles não são capazes de responder todas as perguntas
importantes sobre vantagens relativas de uma droga sobre a outra. Os estudos de
medicamentos costumam ser muito curtos para identificar até mesmo efeitos de
médio-prazo sobre a evolução dos pacientes.
Apesar
de estudos mais longos estarem sendo realizados para avaliar o perfil de
segurança e benefício cardiovascular dos hipoglicemiantes orais, até mesmo eles
podem estar sendo controlados demais, a ponto de excluírem variáveis que
refletiriam de modo mais acurado o uso dos novos hipoglicemiantes na prática
diária.
Se a
metformina reduz de verdade a mortalidade, essa é uma pergunta que
provavelmente não será respondida nem mesmo após um duradouro estudo clinico
randomizado controlado. O que fica registrado é que temos ainda muito a
aprender sobre os hipoglicemiantes orais - e que a boa e velha metformina
continua firme, forte e saudável na parada.