10 junho 2016

Resiliência: como desenvolver em 5 passos?

© Dr. Alessandro Loiola



Toda vez que duas áreas da ciência conversam, nasce algo de novo e interessante. Foi assim quando a Engenharia encontrou a Medicina, e ambas produziram ferramentas diagnósticas de enorme utilidade como a ultra-sonografia e a tomografia computadorizada. Recentemente, a Psicologia dialogou com a Física e descobriu um conceito muito versátil: Resiliência.

Para entender o que é Resiliência, é preciso antes compreender os tempos em que vivemos. Segundo Woody Allen, “nunca antes na história da humanidade as pessoas se viram frente a tantas encruzilhadas: alguns caminhos levam ao desespero, outros à desesperança, e outros à extinção completa da raça humana. Vamos rezar para que a sabedoria nos permita fazer a escolha certa”.

Esta sabedoria se chama Resiliência. Na Física, Resiliência é a quantidade de energia que um material é capaz de receber antes de se deformar de maneira irreversível. Na Psicologia, Resiliência virou a capacidade de ter coragem para mudar o que pode ser mudado, serenidade para aceitar o que não podemos resolver, e inteligência para diferenciar uma situação da outra.

Os cientistas calculam que o desenvolvimento da Resiliência é capaz de reduzir em até 75% o risco de problemas cardíacos. Contudo, o maior obstáculo está na resposta instintiva de “luta ou fuga”: pessoas acostumadas a viverem no limite podem achar a idéia de Resiliência um sinal de fraqueza, resistindo (mesmo que inconscientemente) às medidas de controle do estresse.

Se você quiser vencer seu instinto e tornar-se um mestre na arte da Resiliência, basta seguir 5 passos simples. Anote aí:

1. IDENTIFIQUE A FONTE DE ESTRESSE. Anote em um diário tanto as experiências negativas quanto as positivas. Após uma ou duas semanas, você será capaz de identificar as 3 principais situações estressantes de sua vida. Veja o que pode ser feito para eliminá-las de sua agenda.

2. REESTRUTURE AS PRIORIDADES. Nem sempre é possível ou prático eliminar todas as situações estressantes. Nestes casos, a saída é aumentar o peso do lado positivo, priorizando as atividades que lhe dão prazer.

Pequenas decisões ao seu favor podem ser o bastante para construir uma existência menos estressante e muito mais produtiva: não abra mão dos seus finais de semana ou férias. Utilize suas horas de folga para planejar passeios (e faça-os !). Guarde alguns minutos todo dia para fazer absolutamente nada. Uma vez por semana, saia do cardápio e coma uma guloseima, etc.

3. AJUSTE SUA RESPOSTA. As pesquisas mostram que todos podem aprender a dosar o padrão de reação emocional ao estresse.

Por exemplo, no bar beira de praia, ao receber sua porção, não se exalte. Comente para o cozinheiro enquanto cospe para o lado: “rapaz, os caranguejos estão tão frescos que ainda dá pra sentir o gosto da areia neles!”.

4. UTILIZE TÉCNICAS DE RELAXAMENTO. Tudo bem, você ameaçou perder as estribeiras quando o cozinheiro lhe trouxe uma colher e disse sorrindo, apontando para a casquinha de siri: “é pro senhor comer os grãos mais sossegado”. Não quebre o quiosque todo ainda: tente algumas técnicas de relaxamento antes.

Respirar fundo aumenta a oxigenação do cérebro e reduz os batimentos cardíacos. Inspire e expire lenta e profundamente pelo nariz, enquanto conta até dez. Repita o exercício até que a imagem do cozinheiro sendo estrangulado desapareça de sua mente.

5. ACEITE AJUDA. Ter uma boa rede de amigos é essencial. Por exemplo: vai que o cozinheiro dá dois de você? Impossível estrangular o cabra sozinho, sob o risco de ser preparado por ele feito um Peroá bem na frente das crianças.

As pesquisas mostram que a maioria das pessoas Resilientes possui muitos amigos. Afinal de contas, se fosse para você resolver todos os problemas do mundo sozinho, para que haveria tanta gente espalhada por aí? Não tenha medo de pedir ajuda – a surpresa conta a seu favor.

07 junho 2016

Da Série “Péssimas ideias, bons Negócios”: A Invenção da Adolescência

© Alessandro Loiola


Quando eu era uma criança, 
eu falava como uma criança, 
pensava como uma criança 
e agia como uma criança. 
Quando me tornei Homem, 
deixei de lado meus jeitos infantis. 

(1 Coríntios, 13:11)





A ideia de que crianças levam décadas para tornarem-se adultas, passando por um intervalo de “adolescência” e de “adultos jovens”, é uma concepção caprichosa e relativamente recente na evolução de nossa espécie. 

Antes dessa maluquice ser inventada, esperava-se que as crianças assumissem o papel de adultas assim que fossem capazes de tanto, aprendendo as habilidades necessárias com seus parentes e alcançando a idade adulta assim que chegassem à puberdade. As mudanças nos conceitos sobre “estágios da vida” é um exemplo incrível de como a sociedade e os governos constroem nossas noções de Idade.

A adolescência como a conhecemos era mencionada mal e porcamente antes do final do Século XIX. A análise de materiais escritos entre 1800 e 1875 mostram praticamente nenhuma utilização deste termo e uma preocupação muitíssimo discreta com este estágio da vida (e seus comportamentos característicos). 

A invenção da adolescência decorreu de 3 fatores principais: a aplicação da tecnologia para aumento da produtividade; a afluência de pessoas que este processo gerou, e a transição demográfica que o acompanhou. Graças ao ganho em tecnologia em produção, as famílias puderam se tornar sistemas menores e biologicamente mais estáveis. A população adulta urbana cresceu e os “adolescentes” saíram da força de trabalho, sendo deslocados para as escolas. 

O aumento da dependência dos pais e do tempo livre fez-se acompanhar da criação de um mercado novo para produtos bem direcionados para ele e pronto!, temos essa bizarrice agora aí.

Puberdade precoce

Paradoxalmente, no passado, a puberdade chegava mais tarde, mas a ausência de supervisão dos pais chegava mais cedo. Romeu e Julieta carregavam o peso do mundo em seus ombros – ainda que fosse um mundo bem menor que aquele que os adolescentes habitam hoje. 

Ao longo de todos os séculos que se passaram, uma pessoa sexualmente madura nunca era tratada como “uma criança em crescimento”. Hoje, indivíduos sexualmente maduros passam 6 ou mais anos (digamos, dos 12 aos 18, muitas vezes bem mais que isso) vivendo sob a autoridade de seus pais. Baseado em quê sistema na natureza poderíamos esperar que isso funcionasse?

Desde meados do Século XIX, a puberdade – definida como advento da maturação sexual e início da “adolescência” - tem retrocedido 1 ano a cada intervalo de 25 anos. Hoje, ela ocorre cerca de 6 anos mais cedo que em 1850: por volta dos 11-12 anos entre as meninas, e 12-13 anos para os meninos. 

Ainda não se sabe direito o que desencadeia a puberdade. É possível que o momento em que a puberdade se inicia tenha retrocedido devido à melhora da nutrição durante o período pré-natal e a infância. 

Entre os demais primatas, os indivíduos fisicamente maduros não são bem vindos na família: a competição sexual torna essa convivência impossível. Mas, entre estes e outros animais, a maturidade física coincide com a maturidade mental, então a separação do indivíduo de seu núcleo familiar não constitui exatamente uma rejeição.

O jovem cérebro jovem

Se hoje em dia nossas crianças se parecem com adultos mais cedo do que nunca, isso não significa que elas sejam adultas de fato: na nossa espécie, o cérebro não cresce no mesmo ritmo dos demais órgãos e sistemas. 

A colisão entre a maturidade física e a imaturidade mental do Homo sapiens não apenas confunde os pais, mas também lança o adolescente em situações ridículas. Por exemplo: eles se tornam intensamente interessados em romance, mas suas ideais de romance são absurdamente simples, culminando em bilhetes que são trocados na sala de aula ou posts no Facebook dizendo coisas como “Você gosta de mim? Marque sim ou não”. 

A puberdade não é o único marcador da adolescência. Também observa-se um lento aumento da capacidade de pensamento abstrato e raciocínio relativo. Os adolescentes tornam-se capazes de refletir sobre grandes tópicos – Morte, Destruição, Sentido da Vida -, mas essas reflexões tendem a gerar angústia e depressão. Eles estão sexualmente maduros mas ainda vivem sob a tutela dos pais, como diabos irão mudar o mundo desse jeito?

A descoberta pelo adolescente de que tudo é relativo leva a um debate cansativo de todas as regras que lhe são apresentadas. Eles levarão um tempo se lambuzando com o doce da Contestação Infinita até compreenderem QUAIS brigas valem à pena e quais não valem.

Os adolescentes também procuram a autonomia que lhes falta. Eles querem ficar sozinhos porque têm “coisas demais na cabeça”. Curiosamente, esse desejo de solitude deriva justamente da importância dos relacionamentos sociais. Avaliar as vantagens e desvantagens das diversas situações a que eles são expostos requer um certo tempo sem fazer nada. 

Apesar de não parecer, nesta fase os laços familiares têm mais importância do que você supõe e oferecem valores e parâmetros sólidos de interação sobre os quais os adolescentes construirão suas próprias verdades de adultos.

Não culpe os hormônios

A despeito do que quer que cause o humor tipicamente chato do adolescente, os hormônios têm ganhado um crédito exagerado por isso. 

A produção hormonal que dá forma aos nossos corpos se inicia por volta dos 7-8 anos de idade, e as crises que enchem o saco tipicamente ocorrem entre os 11 e 14 anos – nessa época, os hormônios já andam pela vizinhança há alguns anos, isso elimina deles uma boa carga da culpa. 

O mais provável é que os surtos da adolescência estejam mais relacionados à intensificação dos estados emocionais, ao aumento das cobranças sociais e escolares, e ao fluxo de eventos que são apresentados ao jovem e suas novas responsabilidades frente a este mesmo fluxo. 

Como todo mundo adora um bode expiatório, então descemos a lenha nos hormônios. É mais fácil culpá-los que assumir 100% da responsabilidade pela própria imbecilidade.

Pingos nos is

Nas palavras de Schoen-Ferreira et al: “A sociedade contemporânea ocidental estendeu o período da adolescência, que não é mais encarada apenas como uma preparação para a vida adulta, mas passou a adquirir sentido em si mesma, como um estágio do ciclo vital”. Este é o grande erro. Valorizamos o jovem em grande parte por ser jovem, pelas suas características físicas de jovem, pelas suas ideias libertárias e descompromissadas de jovem, e não pela sua demonstração de vontade, compromisso e domínio das habilidades  necessárias para tornar o mundo um lugar melhor para todos.

Se você não é mais criança, então trate de colocar-se rapidamente à altura das competências do mundo adulto. ESSA deveria ser a mensagem passada em cada ensinamento durante a “adolescência”. E as competências do mundo adulto não dizem respeito apenas à capacitação profissional. Elas vão além. 

Tais competências incluem o imprint de fortes noções de decência, moral, disciplina, generosidade, empatia, estoicismo e altruísmo, e não o deslumbramento ou - pior - a celebração consumista e paternalista com essa invenção inútil que batizaram de “adolescência”.

****

Referências Bibliográficas: 
1. Esman AH. G. Stanley Hall and the invention of adolescence. Adolesc Psychiatry. 1993;19:6-20. 
2. Demos J, Demos V. Adolescence in Historical Perspective. Journal of Marriage and Family 1969; 31(4): 632-638.
3. Schoen-Ferreira TH, Aznar-Farias M; Silvares EFM. Adolescência através dos séculos. Psic.: Teor. e Pesq. vol.26 no.2 Brasília Apr./June 2010.

03 junho 2016

A Sociedade Emasculadora

© Alessandro Loiola


Vivemos uma cultura "moderna" que sistematicamente degrada a virilidade. Nossos valores involuíram a um tal ponto em que a sociedade espera que o homem aceite de bom grado o papel de serviçal infantilizado, assistente sensível, subserviente e emasculado. Do outro lado, a mesma sociedade há décadas vem ensinando à mulher que ser "esperta e descolada" significa ser "rude e debochada" em relação à masculinidade. 

Não muito tempo atrás, eu estava na fila do cinema e ouvi duas mulheres conversando:
- Puxa, amiga, tempo que não te vejo!
- Tem mesmo. Terminei ficando mais em casa no final da gravidez. Mas graças a deus correu tudo bem e ela nasceu com saúde.
- Quer dizer que você tinha um filho e agora teve uma filhinha?
- Sim.
- Puxa, que sorte, você ficou com um casal! Apesar de quê, criar uma menina é bem mais difícil que criar um menino, né?

Fiquei pensando com meus botões: em que Século essas mulheres vivem? Porque, de onde eu enxergo, criar um menino é tarefa das mais difíceis nos dias de hoje: tudo que um menino faz e diz e pensa e sente é considerado completamente errado do ponto de vista de nossa sociedade metrossexual. 

Veja: os Homens tem essa inclinação surpreendente para serem e se comportarem como Homens, mas este traço de personalidade vem sendo tratado como uma espécie de maldição pelos padrões de aceitação social atuais. 

O resultado dessa distorção da Masculinidade está produzindo uma geração de homens jovens que serão inuteis como Homens, pois foram ensinados desde a tenra infância a negar e repelir cada um de seus instintos biológicos. Então, depois que tivermos destruído a virilidade desses meninos, nós, como sociedade, nos queixaremos que os homens não têm mais ímpeto, bravura, ambição, resiliência, estoicismo, instinto protetor ou "pegada".

Não há nada engraçado nisso. É, sim, preocupante.